E... cada região do mundo elegeu
seu cereal preferido: o trigo se difundiu na região mediterrânea, o sorgo no continente
africano, o arroz na Ásia, o milho na América. Em torno dessas plantas organizou-se
toda a vida daquelas sociedades: relações econômicas, formas de poder político,
imaginário cultural, rituais religiosos (...). A própria invenção da cidade,
percebida pelos antigos como lugar por excelência da evolução civil, não seria
possível sem o desenvolvimento da agricultura. Nesse processo, as sociedades
não se adequaram simplesmente às condições impostas pelo ambiente.
Modificaram-nas de modo profundo, introduzindo culturas fora das áreas
originárias e transformando a paisagem em função disso. É nesse contexto
cultural que as primeiras sociedades agrícolas elaboram a ideia de um “homem
civil”, aquele que constrói artificialmente sua comida. Uma comida que não
existe na natureza e que serve para distinguir a identidade das bestas da
identidade dos homens. O pão, na região mediterrânea, área do trigo, representa
essa distinção. Somente os homens sabem fazer o pão, tendo elaborado uma
sofisticada tecnologia que prevê uma série de operações complexas fruto de
longas experiências e reflexões. O pão representa a conquista da “civilização”.
(...) Papéis simbólicos idênticos revestem o vinho e a cerveja, bebidas
fermentadas que, como o pão, não existem na natureza, mas representam o resultado
de um saber... e o homem aprendeu a dominar os processos naturais,
utilizando-os em benefício próprio. (Massimo Montanari)